Márcio, gestor de uma empresa da era da informação, está a caminho do escritório. Antes mesmo do primeiro bom dia, já é recepcionado por uma mensagem notificando-o que o indicador de lucratividade está abaixo da meta para o mês. Isso o deixa preocupado, afinal já estamos na última semana, não há muito tempo hábil para “correr atrás do prejuízo”.
É hora de mergulhar nos números antes de se reunir com a equipe para “dá um gás na moçada” e, “com fé em Deus”, recuperar o espaço perdido. Enquanto mergulha nos números de vendas, custos e descontos para entender o porquê de a margem de lucro está aquém da expectativa, “encomenda” a reunião para dona Zuleide, sua secretaria: “dona Zuleide, convoca os gerentes para uma reunião as 11:00, pontualmente”.
E Márcio então dedica as horas que antecedem a reunião a montar vários cenários no seu painel de indicadores super recheado por mais e mais informações da área comercial, contando inclusive com uma robusta solução baseada em “machine learning”, “big data”, análise preditiva e todo o arsenal que a área de tecnologia da informação foi capaz de colocar à disposição do nosso gestor comercial.
Então o relógio marca 11:00. Cícero, o gerente que se dedica a região mais lucrativa, chega esbaforido, no limite do horário, perguntando ao “seu Márcio” se realmente ele precisa participar, pois está prestes a fechar um negócio capaz de recuperar o número. Márcio é irredutível: “trata-se de uma reunião de emergência, você precisa participar”. Cícero, incrédulo, envia uma mensagem pelo celular ao vendedor que está tratando com o cliente: “tenta vender dentro da margem ideal, se não conseguir, atende ao pedido de desconto do cliente, paciência”.
Márcio então, orgulhoso da sua solução tecnológica, inicia a explanação com os indicadores no mapa, realçando as áreas cujas vendas representam a menor margem de lucro, e pede explicações para o responsável, que lhe fala: “é a concorrência seu Márcio”. As desculpas verdadeiras ecoam pela sala de reunião e, a cada nova pergunta, o indagado tira uma do bolso: “é o cliente que pede muito desconto”; “é o vendedor que não consegue repetir desempenhos passados”; “é o produto que não está tão bom quanto antes”; “é a publicidade do concorrente que caiu nas graças da clientela” …
Após discutirem muito sobre a margem de lucro das vendas e pincelarem as várias desculpas verdadeiras, a reunião se encerra, nenhuma decisão relevante é tomada e Cícero fica a se perguntar qual benefício a companhia obteve com essa reunião. Ele então liga para o vendedor e pergunta se fechou o negócio, ao que ouve desesperançoso de atingir a lucratividade desejada no final do mês: “Cícero, fechar nós fechamos, mas com um desconto daqueles”.
Márcio então liga para Yuri, gestor da TI, e esbraveja: “Yuri, esse seu sistema não me ajuda em nada … veja, eu até sei onde está o problema, qual o produto e quais os clientes que estão derrubando nossa lucratividade, mas, e daí, acabei de sair de uma reunião em que o sistema não nos ajudou”. Yuri então vai à sala de Márcio e apresenta o módulo de machine learning com dicas de quais decisões podem ser tomadas, baseadas no sucesso de decisões passadas. A análise preditiva, baseada em algoritmos estatísticos, é capaz de predizer com grau controlado de erro a curva da rentabilidade para as próximas semanas.
Márcio retruca, “Yuri, veja, tudo isso é muito impressionante, mas e a concorrência? Eles estão com uma campanha muito agressiva. Nossos vendedores não estão performando. Isso não me ajuda, preciso de algo que ainda não sei o que é”. O desespero de Márcio sensibiliza Yuri, que posiciona a tecnologia no seu devido lugar: “Márcio, a tecnologia não nos substitui, ela representa um apoio importante para nossa tomada de decisão. Veja, sem esses mecanismos, nossa visão seria ainda menos clara, mas certamente existem outros elementos que precisam ser analisados para uma boa tomada de decisão”.
Márcio então avalia suas alternativas de contrapor a companha do concorrente e chama a área de marketing para juntos pensarem em algo para a última semana do mês. O fato é que a liderança de Márcio está ligada no resultado, ele está preocupado com o que funciona e o que vende. As esperanças do nosso gestor estão totalmente depositadas em um sistema técnico, que, por si só, não é capaz de gerar resultados perenes e satisfatórios.
Sem dúvidas, a inteligência ampliada (humana + artificial) municiada pelo volume imenso de dados gerados pela interação humana com a internet (big data) é capaz de resultados incríveis, a ponto de um fornecedor de conteúdo de filmes lhe sugerir com um percentual alto de confiança o seu próximo filme na página principal deles. Mas, qual a diferença entre essa empresa e a de Márcio? O netflix, assim como amazon, facebook, linked in, google, dentre outros que trabalham algoritmos de aprendizado de máquina com maestria, estão ligados no cliente. Suas equipes frequentemente estão conectadas com o propósito organizacional. Essas empresas apontam para uma relação muito mais voltada a redes internas conectadas por um desafio, do que a organogramas verticais datados de 600 a.c., na era de Alexandre, o grande.
Então, hoje a sua visão está mais próxima das empresas do século 21 ou da estrutura ligada no controle com a visão exclusivamente voltada ao resultado? Isso vale uma reflexão?
Por Danilo Andrade
Diretor da Horus ITS